AUTOR: IVO MARTINS
EDIÇÃO: (CD Liner Notes) Tone of a Pitch Records DATA: Novembro de 2008
Ao assistirmos ao concerto gravado neste trabalho mal imaginávamos o que seria escutar o seu registo passado
um ano. Agora facilmente percebemos como se processa a informação dos todos os acontecimentos através do
mundo presente e como todos factos podem ser transmitidos a todas as pessoas. Se em determinadas
circunstâncias verificamos que existem perdas evidentes e irreparáveis na representação da matriz original,
noutras detectamos ganhos surpreendentes sobre a rememoração dos vários actos que este documento sonoro
vem reavivar. A música deste projecto possui as referências fundamentais sobre o seu acontecimento inicial,
agora transformado em repetição, em momento renovado, numa cópia através da qual temos a possibilidade de a
ouvir infinitamente.
Nesta obra mais real do que a realidade que lhe deu origem, os silêncios adquirem uma profundidade inusitada;
a sua depuração alarga-se e surge amplificada pelos espaços que separam todos os intervenientes; a contenção
dos músicos parece ainda mais tensa e a interioridade das suas abordagens revelam-se mais intensas. Detecta-se
uma formalidade experimental que envolve todas as movimentações musicais e incentiva olhares mais livres
sobre uma música que se desenvolve em seis composições reflectidas entre si como se fossem um jogo de espelhos.
Estas improvisações são pequenas sobreposições, processos de assemblage sonora - o termo assemblage é
incorporado às artes em 1953, cunhado por Jean Dubuffet (1901-1985) para fazer referência a trabalhos que,
segundo ele, "vão além das colagens". O princípio que orienta a realização de assemblages é a "estética da
acumulação"”, que se exprime em miniaturas sobrepostas, seguindo a dinâmica da aleatoriedade sob a qual os
músicos têm a liberdade de trocar e de partilhar as suas ideias e todas as suas propostas de som. O projecto
formando a partir deste mecanismo agregador é uma reunião de quatro instrumentos, que se manifesta numa
totalidade/diálogo, enveredando pelas formas mais simples de construção, apoiadas numa conjuntura
equilibrada por momentos sonoros acústicos que interagem descomprometidamente no seu decorrer.
